EVANS, Rachel.

Eu não te conheço o suficiente para compartilhar a minha história, você é confiável? Bom, de qualquer forma vou te dar espaço para conhecer um pouco sobre mim embora isto me provoque certo desconforto. Não que uma pessoa com quinze anos possua uma gama extensa de fatos e acontecimentos importantes sobre sua vida...

Não tive a sorte de ter irmãos, sendo assim acabei por ser aquela criança cheia de mimos e zelos sem contudo ser birrenta, mimada e fútil. Meu pai costumava brincar comigo ao chegar do trabalho enquanto mamãe ia para a cozinha preparar o nosso jantar, bife com batatas ainda é meu prato preferido. Entre a escola e a vida familiar houve quedas de bicicleta, animais de estimação, inúmeros machucados e coleguinhas que hoje não são tão presentes em minha vida. Sempre fui curiosa, mas naquele tempo minha curiosidade acabava em curativos e sorvetes, tinha um dom natural para me esborrachar entre uma aventura e outra.

Lembro de ir sempre à casa da minha avó materna nos finais de semana, meu avô morreu antes de eu nascer e eu era sua companhia preferida, naquele tempo eu falava muito, diferentemente de hoje. Lá é minha segunda casa, meu porto seguro e é certamente aonde alguém irá me encontrar quando meu mundo ameaça desabar sobre minha cabeça, é involuntário, quando vejo estou no quarto que ela fez para mim quando eu ainda era pequena.

Eu sou nativa desta cidade, nunca ultrapassei as fronteiras que a delimitavam e confesso que ainda hoje não sinto vontade, aqui tem uma aura de mistério que me prende de tal forma que não consigo pensar em outra coisa a não ser descobrir que mistérios são esses que rondam esta região. Meus pais, assim como uma quantidade significativa de moradores da cidade naquela época, trabalhavam para a então extinta fábrica, o que resultou em uma garota órfã de mãe e um pai alcoólatra que não consegue superar a morte de sua amada esposa. Tudo bem, há dias que isso não me incomoda tanto, tem dias que eu quase posso esquecer de que ela não está mais aqui, até eu chegar em casa e vê na embriaguês do meu pai o constante lembrete de que ela não vai mais voltar.

Até esse ponto minha vida era bem normal, a casa onde morava me lembrava minha casinha da Barbie, o retrato da família feliz, bons tempos aqueles... Sinto saudades. Mas tudo não esta perdido, minha avó materna, Ema, supre boa parte do carinho e atenção que uma adolescente necessita, ela não me faz mudar, me aceitando do jeitinho que sou e isso é reconfortante. Também é lá que meu gato de estimação mora, depois que me mudei para o apartamento não pude levá-lo comigo devido às normas do condômino, peguei o Nox em um terreno abandonado, na época aquela bolinha peluda preta não era o gato preguiçoso que tenho hoje, mesmo assim o amo.

Falando em amor, acho este um assunto complicado... Devo não ser normal para um adolescente de quinze anos, a escola está repleta de garotos lindos e eu não procuro interagir com eles mas posso supor que existam alguns decentes o suficiente para manter um namoro legal... A verdade é que eu sou um tanto desajeitada e prefiro me afastar e me manter na linha de conforto ao investir na paquera e me expor ao ridículo. Ou talvez só esteja à espera de um garoto diferente e especial que possa ver em mim algo mais do que a estranha garota fazendo despertar em mim sentimentos inesperados. Eu sei o que você está pensando, e provavelmente irei concordar, eu sou uma idealista no quesito “romance”, por isso por hora eu me abstenho destes assuntos do coração.

Não sei se sou uma boba mas sinto que por trás daquele incêndio houve outras coisas envolvidas que fogem a compreensão humana... E que a morte daquelas pessoas teve algum significado, mas, qual? Quando não estou na escola ocupo boa parte do meu tempo (ta bom, todo o meu tempo livre) pesquisando a história local e coisas sobrenaturais como magias, espíritos e coisas relacionadas. Bom, é nessa parte que você me chamar de maluca sai correndo, eu não ligo. Seja o que for, prefiro me empenhar em algo em que eu realmente acredito ao me entregar a destruição pessoal como meu pai faz, esse é o meu jeito de lidar com minha perda.

Depois que meu pai se entregou à depressão e por fim ao álcool não nos sobrou muito que fazer quando ele foi despedido de inúmeros empregos, nos mudamos para uma acomodação simples em uma área onde a especulação imobiliária não elevou muito os preços das moradias. Na verdade não sei ao certo como ele ainda consegue manter esse pequeno apartamento onde o maior luxo com certeza é o meu computador com internet arcaica... Bem, eu sei que é meio decepcionante mas isso é tudo que tenho a te dizer. Minha vida é está: meio trágica, meio deprimente e sobre todos os aspectos monótona... No entanto sinto que algo está prestes a mudar...

Pessoas curiosas me dão nos nervos, mas é claro que você iria querer saber como eu sou ou do que gosto... Ai! Isso me dá dor no estômago! Eu não sou esse tipo de pessoa que fala muito, gosto mais de observa do que falar, as pessoas nem sempre contam tudo ou a verdade sabia? Tampouco sou anti-social, gosto de preservar meus pensamentos e sentimentos, assim a palavra mais adequada seria reservada, é difícil encontrar pessoas que respeitem isso quando se é ainda uma estudante do ensino médio. No geral sou aquela garota meio esquisita que se senta afastada dos demais e que nunca é visto em companhia de outras pessoas. No entanto, esse ar esquisito me deixa com um jeito misterioso, acho que andar pesquisando em livros velhos, arquivos empoeirados e ler artigos sobre coisas sobrenaturais me deixou assim, não sei dizer ao certo.

Gosto de ficar sozinha, andar sozinha e estar sozinha (aqui me refiro aos garotos), amizade não me faz muita falta apesar de haver dias que me sinto tão sufocada que preciso expressar isso de alguma forma e por isso escrevo, possuo um diário que nem em meu pior pesadelo seria lido por outra pessoa. Você concluiu certo: sou solitária. Também acrescentaria nostálgica e melancólica (te proíbo de me chamar de emo, eu não me visto como eles).

Divirto-me lendo literaturas de horror à lá H.P. Lovecraft e vendo filmes da mesma linha, meu principal hobbie é ler sobre coisas sobrenaturais, misticismo e esoterismo. Um segredinho: eu danço muito bem, é algo espontâneo, bonito e expressa através do corpo mais palavras que a linguagem poderia proferir. Como já deve ter percebido pela leitura destas poucas linhas tenho um humor meio distorcido mesclado com doses rasas de sarcasmo. Eu sou uma mistura nada amistosa, desculpe! Mas há quem possa se encantar (claro, aqui entra as cotas de excêntricos da cidade) com essa garota miúda, de cabelos escuros, olhar enigmático, andar furtivo e silencioso.

Isso já está ficando um pouco constrangedor, concorda? Ta, ta, ta... Faz parte do processo, eu sei... Basicamente costumo usar roupas pretas ou de tons escuros, minha preferência é calça, botas, blusa básica e jaqueta. Vaidade não é meu ponto forte então uma maquiagem básica já me deixa satisfeita, termino o conjunto com o cabelo ondulado e comprido usado quase sempre solto.

Possuo estatura baixa, meu corpo é magro e isso me deixa com aparência menor do que meus 1,60m deveriam aparentar. Tenho um rosto com traços orientais, herança de minha mãe, meus olhos são castanhos escuros e puxadinhos, tenho lábios pequenos e eu não deveria dizer, mas sou até bonitinha para os padrões de beleza, basta olhar essa imagem aí em cima... O resto vocês vão conhecendo aos poucos, se me conquistarem.

Ah, er... Tem aquela parte dos pertences... Mas como já havia mencionado, não possuo muitos recursos então não tenho muitos pertences, apenas uma bolsa de couro inseparável, um celular não muito moderno com parcos créditos e uma bicicleta que se torna meu principal (e porque não único) meio de transporte. Estou esperando o dia em que poderei trabalhar para ter melhores condições, você conhece algum lugar que aceita garotas de 15 anos para trabalhar?